Thursday, November 30, 2006

joana farc

tampa de nuvem

não perder a cabeça,
sempre tive medo de não saber tomar decisões,
mas eu insisto.
tampa de nuvem,
antes mudar o cabelo, ou deixar a raiz descansar
não perder a cabeça
portanto eu insito
antes de seguir com outro existo
faz nublado uns dias
pra eu afogar os olhos e os pés.

Wednesday, November 29, 2006

a hora que não atinge, não comemora.
há uma criança de oito dias sobrevivendo sem cérebro
é arte e manifesto estuprar prostituta
do lado que eles estão eu não posso entrar
de verdade eu tirei o esparadrapo do meu furo no fluxo racional
ao meu lado, o garoto que engoliu o irmão tb não tem outra sina
pela calçada quebrada, nós vamos mudos, pq não temos em comum
só ter pensado que era hora de fazer
sopro
de caos
e cuspindo do alto de um prédio
escondemos oito moleques da febem na cabeça da bebezinha que veio sem.
terrorismo astral
voltar as coisas pro lugar de onde cabem.

Tuesday, November 28, 2006

la paloma en sangre

la paloma

as pastagens de sol a pino

quando tem dor e eu choro, é por não aguentar conter a beleza do momento.
acredito que os telhados estejam vivos, que a água é mais linda que o diamante porque é fugaz.
gosto dos insetos q são fortes pingentes ariscos.
eu tenho cadarço no coração, mas não se trata de espartilho.
é preciso andar, como no cinza,
é preciso fazer sentido.

Sunday, November 26, 2006

as pastagens ao acordar

quando estava na barriga de sua mãe, carregava o feto do irmão no estomago.
tiraram logo que ele nasceu. é o que dizem.
o que não dizem é do buraco,
de sentir fome por dois
de andar por si e por quem não veio, então precisa ver tudo.
o que não dizem é que os fantasmas são por direito os mais exigentes.
todos os campos parecem tranquilos ao acordar.
o que não se diz, é que pasto com orvalho arde mais.
é mais afiado correr cedo.
quando estava na barriga da mãe, uma condição estranha o fez especial.
o que não dizem é que ele odeia ser o deus que engoliu o irmão e gostou do seu primeiro dia de escola, mesmo que ninguém desse atenção pra ele.

Friday, November 17, 2006

ocrea-ana-rebu

a fisgada nos rins veio como suspensórios internos, puxando a carne roxa e mole dos orgãos pra cima e rasgando as pontas com gancho. doeu pra caralho. ele/ela caiu no chão.
rins são os orgãos mais unisex e internos que alguém pode ter. se nós fossemos animados e andróginos e mesmo assim procriássemos,
os rins
seriam os úteros e sacos
os rins guardariam o fecundado com pedras de ácido e cálcio
os rins são nosso coração amargo
a fisgada nos rins podia ser facada, garfada, agulhada ao vivo ou em voodoo
a fisgada nos rins
no fim
era só um tropeço do amor

ó fato fatídico

vem de tarde
como uma faca cansada
o bife de cada dia
a pausa de cada parte

vem de tarde
como uma faca desafiada
o sangue na neve
meus olhos que ardem

vem de tarde
como uma faca enovelada
as entranhas confusas
a espera de que acabe

vem de tarde
como uma faca prateada
o umbigo que expira
a morte de aguarde

Thursday, November 16, 2006

barro na vidraça

o de fora empurra meu peito que
pra dentro desloca espaço e
empurra meu choro pra fora
e eu não quero chorar.
eu não posso, desmereço sofrer porque,
parece,
que eu não sinto.
não to sentindo nada, como todas as más.
eu sou assim, não sei porquê.
eu queria rezar pra ti,
desperadamente me esqueça, me desame, não se magoe da minha solidão.
eu queria te dar meus joelhos.
eu queria dizer que eu menti,
eu queria dizer que eu nunca te amei
eu queria não ter essa matilha de buracos dentados mastigando meus olhos
eu queria ser querida
eu queria ser menina
mas eu sou só mais um lobo humano.

Tuesday, November 14, 2006

Um-Vã-Zil

quando tudo parece que está errado ou caindo,
quando vc perde,
quando vc tropeça em si mesmo,
enquanto cai, dá um vazio confortável.

são seus olhos abrindo pra mortalidade,
pra grande inefável besta e inútil existência q vc tem,
como todos os outros rasteiros, como todos os perdedores
como todos os presos e as "das dores".

como todos os que não pagam conta pq não contam pra pagar.
como todos os que não morrem pela pátria porque não tem o que dar.

quando vc não vence,
quando vc não acende,
quando vc não convence,
vc, como eu, somos só, como quase todos,
como o numerozão maior das gente, só isso, mais um humano
comendo dormindo defecando
e nada mais que se esperar.

(de vez enquando, é aí que eu descanso, com nada mais a perder, um pouco de paz)

Monday, November 13, 2006

transmudação

tão cansada que insisto em escrever
tão triste que não suportaria ouvir nenhuma música
tão solitária que não desligo a televisão

meu cabelo é tão liso que começa a crescer depressa
minha dor é tão funda que se apressa em inexistir
minha vida enloquece tanto quanto a de qq mortal

de tanto não sentir acrescento casacos

de tanto dizer está tudo aí

de tanto ficar fria, economizo meu rosto

liquidada

sim
eu sou má
fria
desmerecível
sim

sim eu sou só
cretina
asquerosa
barulho
ruim

(preconceituosa, preguiçosa, egoísta, frígida, puta, amarela no azul, preto no branco, materialista, tudo o que não presta na moda dessa estação, sim eu sou)

sim eu sou
a pior opção
uma amarga
o mal, o bucho do buraco do monstro
eu sou algo pra se fugir

nada é mais cansativo do que vc demorar tanto a entender que sim
eu sou ruim
e quero viver assim.

Tuesday, November 07, 2006

vertigem da gente no homem grande

As vezes você olha pra um homem grande andando na rua e isso é tudo o que ele é: um homem grande.
Se ele estiver usando chapéu, é um homem grande usando chapéu
Se ele for seu pai, é o seu pai, homem grande usando chapéu, que os nossos heróis são só os que morrem de algum overdose. Ou sem chapéu.
As vezes um homem grande parece uma bobajona,
as vezes um saco de carne maior do que os sapatos merecem.
As vezes um homem grande parece uma montanha que anda,
algo mto velho e vazio
algo de sério e de armário
algo de coração magro.
Nenhum dos meus amigos gosta de pensar que já é, ou será, um homem grande.
(apesar de todo mundo no fundo querer ser um grande homem)
os homens grandes parecem autores de tooooodas as coisas ruins do mundo,
como as guerras e os cocôs muito fedorentos
um homem grande já não pode gostar muito de crianças, senão vira uma coisa ainda mais feia.
Um homem grande, pelo que me contam, nunca se apaixona
e faz tudo com maldeza de intenção.
Um homem grande que chora é um fraco,
um homem grande que desiste é pra sempre marcado,
um homem grande que se perde não pode aproveitar o caminho,
um homem grande com um machado,
faz tempo
que é só um bandido.
Um homem grande não pode ser peludo pra não parecer urso
não pode ser muito forte pra não causar risco
não pode falar alto pra não ser forte
não pode degringolar no riso
dentro de todo o homem grande
vai morrendo de medo da gente
o melhor dos meninos.

Friday, November 03, 2006

todos os santos 2



de lugares como todos

os santos

eles vêm, como de dentro do coraçao escondido atrás do armário de gordura do músculo coronário

como o segredo que se mantém saudável, que é a melhor santidade

sobreviver

em lugares comuns como todos

os santos

eles, em nós

mastigam seu próprio túnel

através de todas as nuvens do medo

com o peso leve-infinito

de todos os santos

leve até ir.

todos os santos